quarta-feira, 6 de março de 2013

ponto final


Na vida dela havia apenas esquecimento. Empurrava uma memória atrás da outra para um saco sem fundo como se se prendesse num baloiço e se deixasse empurrar fortemente, esticando os pés contra o céu e a cabeça a roçar a areia. Esse desejo de ser criança colado ao corpo de mulher enquanto corria estrada fora, empurrando com os punhos uma memória atrás da outra. Corria cada vez mais veloz como se a quase ausência de forças a colocasse numa outra realidade, ausente de pensamentos. As cidades que haviam percorrido de mãos entrelaçadas a esfumarem-se. Expectativas. As expectativas primeiro. O esquecimento depois. O processo. A ausência de um processo.

Ele voltava sempre que ela o havia esquecido. Os sentimentos borbulhavam dentro de si e ela corria para não o encontrar à chegada, perdida para dentro do seu silêncio angustiado. Há um silêncio desconcertante na morte. Essa ausência galopante que se aproxima mais rápido do que os passos da corrida, essa dor tenebrosa sem ferida aberta, saída de tudo quanto é corpo. Enfim, esse vazio ríspido de navalha afiada que um corpo em corrida pelo esquecimento sempre encontrará à chegada.

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