Uso a palavra escrita porque a cobardia me impede de to dizer presentemente. Escolhi cada uma das palavras, de forma emocionalmente perspicaz até que o vazio do tudo expulsar rompesse dentro de mim. Esperei demasiado tempo. Esperei demasiado naquele sofá onde um dia nos deitamos os dois, onde um dia, dias, meses me fizeste acreditar que ficarias. E hoje, neste mesmo sofá onde te escrevo, confesso que apenas desejo que me ames. Não quero que gostes apenas. Estou cansada que gostem apenas. Quero que cada uma das letras da palavra 'amo-te' te encham a boca, que quase expludam dentro de ti, que te obriguem a pronunciá-las para que não morras. Quero que me ames para que te possa usar como um livro desses que se consomem ferozmente para depois se abandonar numa estante.
Anseio ver-te infeliz nesse teu desejo de me ter para que te ofereça o peito arrancando-te a alma enquanto sorrio. Quero ter poder sobre ti, de ti, de te cortar o peito ao mesmo tempo que me quero prender nesses braços de homem, pôr a nu as tuas fraquezas enquanto faço uso desse teu corpo másculo. Quero esse amor oportunista que apenas retira e pouco ou nada dá, que não deixa marca, tece memórias leves e não pede retorno. Sim, quero ostentar-te a meu lado enquanto amante preso à sua paixão, fingindo amar-te, fazendo-te crer nesse fingimento absurdo de namoro tolo enquanto te abro suavemente uma ferida que te mostra os ossos. Alguém te a há-de lamber. Mas serão precisos meses. Sim, precisarás de meses, digo-te entre dentes com este sorriso cínico. Precisarás desse tempo que parece duplicar na sua demora até que te deixe de correr no sangue.
E rastejarás nessa tua masculinidade perdida, desejando voltar a este sofá. Quero que me ames, porque amando-me serás fraco, porque amando-me eu esquecer-te-ei, porque amando-me este sofá deixará de ser grande demais, porque amando-me sentir-me-ei livre na tua dor. Quero que me ames.
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