Assim que entrei na sala e te vi sentado à mesa enquanto convidado desconhecido soube que eras tu perante esse descontrolo que tentamos disfarçar. Soube-o pelo teu sorriso. Soube-o através dos teus olhos. Soube-o pela forma como me olhaste enquanto dizias o teu nome.
Saber-te comprometido deu-me uma liberdade levemente castradora. Saber-te comprometido aliviou-me o peito, por julgar que a possibilidade de me apaixonar por ti fora cortada na sua raíz, antes mesmo que ela se aventurasse em romper peito fora. E senti-me livre nessa liberdade de poder apreciar cada um dos teus traços, cada linha dos teus lábios, nessa admiração tímida e quase camuflada, de quem não tem receio que à paixão seja dada a hipótese de respirar.
Esse alívio de se estar não sentindo. Esse sentir que nos leva a sentir o peito parecer estalar de calor, os olhos queimar de desejo, a ânsia do toque apoderar-se das mãos. Quanta liberdade há no simples deleite de quem faz do outro simples matéria observatória, matéria analisada ao microscópio da alma, doce tentação suavemente proibida.
Dar-te-ia tudo. Mas dar-te-ei nada. Não preciso amar-te. Não quero amar-te. Prefiro ficar deste lado da mesa, frente ao teu corpo, com esses leves roçar de pés a que pedimos desculpa, tecendo sorrisos enquanto falas, delineando detalhadamente cada momento na imaginação, dando asas ao proibido, à sua concretização numa escala que o real não permite, entre essas linhas que jamais ousarei contar.
Não nos teremos. Desejar-nos-emos eternamente. E a nossa pele será sempre fogo quando nos encontrarmos.
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