Foto: Mila Lippitz |
Julguei-me doente. De uma dessas doenças incuráveis, que parecem assassinar todas as vontades, inclusivé a de ter esperança. Julguei-me mais tarde uma louca. Não porque a insanidade me destruísse a dependência e a racionalidade, mas na verdade porque a insanidade emocional que atravessava todo o meu corpo me deturpava o mundo, moldando-o à sua maneira, à maneira idílica, feita dessas perfeições amorosas que a própria perfeição reconhece ser impossível. Foram várias as vezes, incontáveis vezes as vezes em que me julguei culpada. Culpada por não saber amar, por não saber como amar, quando amar, quem amar.
Tornou-se insuportável. Como uma torre a desmoronar-se para dentro de mim. O coração prestes a explodir, de artérias bloqueadas, esmagado contra o peito, o desejo a alastrar-se como fogo, o amor como alimento fantasma e o vazio. O vazio interno de quem sabe de cor um não gritado sem palavras. Quantas vezes ansiei abandonar o amor numa dessas ruelas onde ele pudesse sentir na pele a dor muda que nos dispara. E ele de mãos entrelaçadas num jogo de brincar entre dedos de quem se sabe uma necessidade absoluta.
Mergulho nas águas gélidas de Outono, como se de certa forma acordasse este corpo de uma realidade que o atravessa e não lhe pertence. Como se estas águas frias e plenas de pureza possam rasgar este sentimento de não pertença, possam lavar uma alma suja que tece crítica em torno do maior dos sentimentos, possam, enfim, massajar esta mágoa dura que se alastra pelos tecidos enquanto o dia rompe por entre a folhagem castanha de estação entranhada. Está sol e eu sou feita de carne.
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