quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

a leveza de te não ter


Assim que entrei na sala e te vi sentado à mesa enquanto convidado desconhecido soube que eras tu perante esse descontrolo que tentamos disfarçar.  Soube-o pelo teu sorriso. Soube-o através dos teus olhos. Soube-o pela forma como me olhaste enquanto dizias o teu nome.

Saber-te comprometido deu-me uma liberdade levemente castradora. Saber-te comprometido aliviou-me o peito, por julgar que a possibilidade de me apaixonar por ti fora cortada na sua raíz, antes mesmo que ela se aventurasse em romper peito fora. E senti-me livre nessa liberdade de poder apreciar cada um dos teus traços, cada linha dos teus lábios, nessa admiração tímida e quase camuflada, de quem não tem receio que à paixão seja dada a hipótese de respirar.


Esse alívio de se estar não sentindo. Esse sentir que nos leva a sentir o peito parecer estalar de calor, os olhos queimar de desejo, a ânsia do toque apoderar-se das mãos. Quanta liberdade há no simples deleite de quem faz do outro simples matéria observatória, matéria analisada ao microscópio da alma, doce tentação suavemente proibida. 


Dar-te-ia tudo. Mas dar-te-ei nada. Não preciso amar-te. Não quero amar-te. Prefiro ficar deste lado da mesa, frente ao teu corpo, com esses leves roçar de pés a que pedimos desculpa, tecendo sorrisos enquanto falas, delineando detalhadamente cada momento na imaginação, dando asas ao proibido, à sua concretização numa escala que o real não permite, entre essas linhas que jamais ousarei contar.

Não nos teremos. Desejar-nos-emos eternamente. E a nossa pele será sempre fogo quando nos encontrarmos.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

fim não proferido

Moviamo-nos pelo desejo. Esse desejo que parece lume, que nos parece incendiar, que nos parece queimar a carne. Movias-te pelo desejo. Unicamente pelo desejo, pelo fervor do apelo do sexo. Eu, movida pelo desejo da paixão que se transformara já em amor prendi-te os lábios assim que me abriste a porta, deixando que me despisses à velocidade do teu comando. Com a tua mão presa aos seios a deslizar pela pele macia do meu corpo e a respiração entrecortada a abafar o silêncio aprisionado no quarto sentia o prazer explodir-te no peito.

Hoje dou-te mais. Dou-te uma outra mulher, que nunca se sentiu tão eu, que te sussurra ao ouvido o que sabe quereres ouvir, uma mulher que te engole a respiração. Hoje dou-te mais, porque este mais será o nada de mim para ti amanhã. Amanhã não estarei cá, nem no dia seguinte, nem no próximo. Saberás tu que esta é a última vez? Perceberás pela forma como te toco, como te olho, como te esmago contra mim que este é o fim, que não te procurarei mais, que não me voltarei a deitar nos teus lençóis encharcados de ti, do teu cheiro, que não me enroscarás nos teus braços pela noite dentro?

O tempo esgotou-se. E com o tempo esgotado esgotou-se a esperança de te saber apenas meu. Os homens deveriam saber ler-nos. Deveriam saber ler-nos sem necessidade de palavra proferida. Se ele me soubesse ler saberia que aquela seria a última vez. Se ele me soubesse ler saberia que eu não queria que aquele momento tivesse título de fim. Se ele me soubesse ler não me teria deixado sair daquele quarto.